08/05/2021
Relator da CPI da Covid afirma que governo Bolsonaro fechou as portas para vacinas
BRASÍLIA, DF - Relator da Comissão Parlamentar de Inquérito
da Covid, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) afirmou, neste sábado, 8, que a
CPI precisa levar em conta como o governo de Jair Bolsonaro minimizou a
pandemia e o papel da vacina para combater a doença, e como a postura do
presidente "fechou as portas" do Brasil para os produtores de
imunizantes. "Isso precisa ser investigado", disse Renan, em
entrevista concedida ao programa Prerrogativas, transmitido pela Rede TVT. O
senador destacou ainda que, se a CPI concluir que Bolsonaro contribuiu para o
agravamento do "morticínio" no País, ele "será responsabilizado,
sim". Renan ressaltou que "seja lá quem" transformou o
chamado tratamento precoce contra a covid-19 em política pública deverá ser
responsabilizado. Para ele, muito do que a CPI pretende apurar
"investigado já está" em campanhas nas redes sociais, discursos e
atos oficiais. "Por isso torço que o presidente da República explique o
que aconteceu, a bola está com ele. Tem que explicar se houve imunidade de
rebanho, imunização natural, por que é que ele defendeu isso, defendeu aquilo.
Porque ele agride a China?", questionou Calheiros. "Espero que o presidente da República não tenha
responsabilidade no agravamento do morticínio no Brasil, espero que a CPI não
chegue a tanto, mas, se chegar, não tenho nenhuma dúvida que ele será
responsabilizado, sim", disse o relator. "Entendo que ao
responsabilizar alguém, responsabilize exatamente aqueles que, por negligência,
omissão, cometeram erros que poderiam ser evitados e possibilitado diminuição
do número de mortes do Brasil na pandemia. Tenho muita convicção, apesar dos
pesares, ameaças, arreganhos, tentativas de intimidação, que a CPI fará sua
parte, cumprirá seu papel", disse. Na entrevista, o senador classificou como uma "irresponsabilidade
absoluta, total" a postura de Bolsonaro diante das vacinas para a
covid-19. "Isso precisa ser investigado", afirmou. "Como o
governo fechou as portas para produtores de vacinas. Não foi só com a Pfizer,
fechou as portas para todos. Porque o presidente disse várias vezes que não
acreditava na vacina, muito menos na chinesa. Ele que diz que vacina que serve,
a que não serve". Esse posicionamento do chefe do Executivo, na visão de
Calheiros, faz com que a situação do Brasil não possa ser comparada a de nenhum
outro país. "Em nenhum outro lugar, um chefe de Estado esteve publicamente
falando esses absurdos para a população", disse o senador. Ainda ao falar que o eventual uso da tese da "imunidade
de rebanho" pelo governo é investigado "profundamente" pela CPI,
Renan questionou a que "roteiro” serve a tentativa de negar a pandemia e o
"torpor contra o isolamento" e vacinas. “Se vai haver impedimento do
presidente, qual vai ser a consequência da investigação, nós ainda não sabemos,
não dá para predizer, mas o que posso assegurar é que nós vamos fazer um
reencontro do parlamento com a verdade”, afirmou. Na visão de Renan, a "equivocada" falta de
colaboração pelo governo na comissão vai levar os trabalhos da CPI para cada
vez mais perto das eleições de 2022. "Se observar o traço em comum dessa
investigação, é que os governistas não dizem nada. Na medida que dificulta o
trabalho, vai levar a conclusão, obviamente, da CPI para as proximidades da
eleição. Mas não é porque a CPI quer que aconteça, mas porque equivocadamente,
eles estão sem saber o que fazer. Governistas não dizem nada. Se esforçam para
não acrescentar nada", disse ele, que é aliado do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (PT), potencial adversário de Bolsonaro na próxima eleição
presidencial. Renan destacou ainda que os trabalhos da comissão se dão
numa circunstância "completamente nova" e que já são públicos
diversos fatos que envolvem as apurações da CPI, como informações oficiais e
execuções orçamentárias do governo. Diante disso, avaliou Calheiros, cabe à
gestão Bolsonaro "negar" esses fatos demonstrando "exatamente o
contrário" do que a sociedade já intuiu sobre o enfrentamento à pandemia.
Caso não consiga, o governo "terá que ser responsabilizado sim". "Muitas informações já estão postas, publicadas, em
Diário Oficial, em execução orçamentária. Isso tudo já está posto, sem que o
governo até agora tenha sequer uma estratégia para negar esses fatos. Cabe ao
governo exatamente negá-lo e demonstrar exatamente o contrário do que a sociedade
intui que aconteceu. Se o governo não conseguir isso - se ele conseguir, ótimo,
facilita nosso trabalho - mas se não conseguir isso, paciência, nessa condição,
ele terá que ser responsabilizado sim", reforçou. “E a percepção da sociedade de que se o governo tivesse
feito certo - e o governo tem na CPI uma oportunidade para demonstrar que fez
certo - se o governo tivesse feito tudo certo, certamente também nós não
teríamos tido que conviver com esse morticínio todo, transformado o Brasil no
cemitério do mundo. Isso é inconcebível, se tiver responsabilidade de alguém
por isso, vai ter que ser responsabilizado sim, e responder por todos os crimes
sejam quais forem, e sobretudo o de responsabilidade, que é um mandamento
constitucional", disse Renan, que repetiu que apesar de
"intimidações", nada fará o Legislativo "recuar". Pazuello usa Exército
como 'biombo', diz Renan Calheiros disse também que o ex-ministro da Saúde e general
Eduardo Pazuello usa o Exército como "biombo" para não depor à
comissão e que, com isso, está criando um "crise" nas Forças Armadas.
Pazuello iria falar à CPI nesta semana, mas seu depoimento foi adiado para 19
de maio, ao informar que teria tido contato com duas pessoas infectadas com
covid-19. Como revelou o Estadão/Broadcast, dois dias após essa alegação, o
ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni (DEM), foi flagrado
numa visita ao ex-ministro da Saúde. "Porque certamente ele não tem muito o que dizer. Temos
respeito muito grande pelo Exército. Não vamos investigar militares, esse não é
nosso papel, eles não precisam ter nenhum receio. Quem tem que continuar com
receio são os aliados da pandemia, do vírus, que vão ter de responder por tudo
isso", disse Calheiros durante o programa 'Prerrogativas', transmitido
pela Rede TVT. Calheiros reforçou ainda que, neste momento inicial dos
trabalhos da CPI, o ex-ministro irá falar à comissão na condição de testemunha,
e não como investigado. Ele lembrou que investigados, por uma decisão do
Supremo Tribunal Federal (STF), teriam direito a recorrer ao silêncio durante o
depoimento. "Na condição de testemunha, ele vai ter que comparecer.
Que o governo use melhor suas energias para esclarecer esses fatos todos. E nós
tivemos essa preocupação de não ouvir ninguém nessa fase inicial da CPI como
investigado, porque isso ensejaria essas preocupações todas. De modo que
queremos que ele compareça, ele será interrogado como os outros foram e serão
interrogados. Ainda como testemunha. Todos que serão nessa primeira fase serão
ouvidos como testemunha", disse o relator. Calheiros disse também que o ministro da Justiça, Anderson
Torres, será chamado a depor, principalmente em razão das declarações dadas em
entrevista à revista Veja, na qual afirmou que iria pedir à Polícia Federal
para obter dados sobre a destinação de recursos federais contra a covid-19 nos
Estados. Para o relator, o que foi dito deveria ser "impublicável"
num Estado Democrático de Direito. "Admitir utilizar a Polícia Federal
como polícia política, isso não pode acontecer. E um ministro da Justiça não
deveria ousar tanto", disse o senador. "Ameaças de utilização política da Polícia Federal, que
como vocês sabem é instituição respeitável, não é fácil aparelhar politicamente
uma PF, eu não acredito que isso venha acontecer", afirmou Calheiros em
outro momento, citando ainda uma possível participação da Agência Brasileira de
Inteligência (Abin) na investigação de Estados e municípios. "As conclusões da CPI irão para o Ministério Público e
para a Advocacia-Geral da União (AGU). A última CPI que impediu um presidente
da República conclui exatamente dessa forma e, no dia seguinte, entidades como
OAB entraram com impedimento no Supremo Tribunal Federal, em função dos fatos
que foram investigados na CPI. Nós vamos definitivamente fazer nossa parte,
haja o que houver. Não vamos aceitar intimidação, utilização da Abin e da PF
como polícia política", disse Calheiros. Filhos do presidente
ainda não devem ser convidados a depor Calheiros disse também que "várias narrativas" que
foram impostas à CPI já se esvaziaram, como a de que os senadores iriam
investigar os militares e buscariam "ampliar o desgaste" do
presidente e de sua família. Por isso, o relator defendeu que, por enquanto, os
filhos do presidente não sejam convocados a depor. "Para evitar aquilo que
eles tentam demonstrar todos os dias, de que nós queremos desgastar a família.
Não vamos colaborar com esses argumentos, para chegar ao final com a
insuspeição guardada", disse Calheiros. "Não vamos fazer acareação do Mandetta com os filhos do
presidente. Eu disse não, não vamos fazer acareação do Mandetta com ninguém.
Quem descredencia (o discurso do ex-ministro) é o governo, então ele que
proponha meios de negar a veracidade do depoimento do ex-ministro",
destacou ainda, reforçando novamente o que achou do depoimento de Mandetta.
"Ele confirmou muitas questões que precisávamos ouvir, eles não fizeram
segredo, enfatizaram que não tinham autonomia, e por não terem autonomia, eles
colaboraram de uma forma ou de outra com o desmonte das políticas públicas no
Brasil", disse o relator. Primeiros depoimentos Para o relator, os depoimentos prestados nesta semana pelos
ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, além do atual
titular da pasta, Marcelo Queiroga, já são indicativos de que a CPI vai
acarretar em algum tipo de consequência para o governo e para um reconhecimento
pela população dos trabalhos da comissão. Crítico da postura dos aliados de Bolsonaro nos trabalhos da
CPI - que têm por sua vez reclamado da condução de Renan -, o relator afirmou
que Queiroga "visivelmente" investiu numa estratégia de não responder
às perguntas dos senadores objetivamente, e portanto, de não "falar a
verdade". Em depoimento na quinta-feira, 6, à comissão, o atual ministro
da Saúde se esquivou de declarar sua opinião sobre o uso da cloroquina em
pacientes com covid, apesar da insistência dos integrantes da CPI em saber da
posição do médico, que está no cargo desde março. "Mas ele ainda reconheceu a existência do grupo
paralelo, constrangimento de algumas oportunidades por ter sido desautorizado
pelos discursos negacionistas de Bolsonaro", observou Renan. "(É) Um morticínio agravado por práticas
irresponsáveis, que apuradas gerarão responsabilidades de algum ou alguns. Não
tenho absolutamente nenhuma dúvida de que nós vamos chegar no desfecho final.
Sinceramente, não torço para incriminar ninguém, responsabilizar ninguém, se o
governo usasse melhor suas energias para esclarecer os fatos, diferentemente do
que está fazendo, seria melhor e facilitaria o trabalho da CPI", opinou o
relator. Cloroquina Ao falar da necessidade de a CPI investigar se o tratamento
precoce contra covid-19, com o uso da cloroquina, foi transformado em política
pública, Renan lembrou a participação do Exército na produção do medicamento.
"Se isso aconteceu, pelo ministério ou não, com órgão paralelo ou não,
seja lá por quem for, quem fez isso vai ser responsabilizado". O relator
quer saber neste episódio "quem mandou" e "quem obedeceu".
"Estimularam a produção dos medicamentos no Exército,
instituição respeitável, quem foi que mandou, quem obedeceu, como vamos
responsabilizá-los. Vamos investigar", disse. Como mostrou o
Broadcast/Estadão, a CPI aprovou nesta semana vários requerimentos de autoria
de Renan que buscam reconstruir os passos do governo Bolsonaro sobre o
incentivo ao uso da cloroquina. Em um deles, ele cobra do Comando do Exército
dados como da origem dos pedidos de produção de cloroquina durante 2020 e 2021
e da distribuição desses comprimidos. Estadão
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