11/06/2021
Bolsonaro quer que vacinados e quem já teve Covid-19 sejam desobrigados de usar máscaras
BRASÍLIA, DF - O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta
quinta-feira (10) que pediu ao ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, um
"parecer" para desobrigar o uso de máscaras por quem estiver vacinado
contra a Covid ou por quem já tiver contraído a doença. O ministro informou ter recebido do presidente o pedido de
um estudo sobre as máscaras, mas especialistas ouvidos pelo G1 consideram a
medida uma temeridade neste momento crítico da pandemia de Covid no Brasil
(leia mais abaixo). Bolsonaro deu a declaração no Palácio do Planalto, ao
discursar durante solenidade de lançamento de programas do Ministério do
Turismo. O presidente usou máscara antes e depois do evento — ele só retirou a
proteção para discursar. "Acabei de conversar com um tal de Queiroga — não sei
se vocês sabem quem é —, nosso ministro da Saúde. Ele vai ultimar um parecer
visando a desobrigar o uso de máscara por parte daqueles que estejam vacinados
ou que já foram contaminados. Para tirar esse símbolo, que obviamente tem a sua
utilidade para quem está infectado", declarou. Depois de participar do evento no Planalto, Bolsonaro fez
uma transmissão ao vivo em uma rede social e voltou a falar no assunto. Durante a transmissão, disse que não impôs 'nada' ao
ministro da Saúde, mas que pediu o estudo sobre as pessoas poderem transitar
sem máscara. "Eu falei com o Queiroga agora. Não impus nada a ele.
Se bem que também tenho que dar minhas piruadas aí, no bom sentido. 'É possível
a Saúde apresentar um estudo aí da desobrigatoriedade da máscara para quem já
foi vacinado ou para quem já foi contaminado e curado, poxa?'. Ele falou: 'É
possível, é possível'. Vamos fazer isso. Vamos ficar reféns de máscara até
quando? Está servindo para multar gente, pessoal. Está servindo para multar. Eu
fui ameaçado agora de multa em São Paulo", declarou. De acordo com dados do consórcio de veículos de imprensa,
11,06% da população receberam a segunda dose de vacina até esta quarta-feira
(9) — 24,48% receberam somente a primeira dose. No total, até esta quarta, o
Brasil tinha quase 480 mil mortos por Covid, segundo o consórcio, e 17,1
milhões já tinham contraído a doença. Em outras ocasiões, Bolsonaro já demonstrou não ter apreço
pelas máscaras como forma de proteção contra a Covid. Em fevereiro, ele usou uma enquete alemã distorcida para
criticar o uso de máscaras. Em agosto do ano passado, contrariando a opinião da
maioria dos cientistas e especialistas, ele disse a apoiadores que a eficácia
de máscara é "quase nenhuma". Um mês antes, havia vetado parte de uma
lei que estabelecia o uso de máscaras em locais públicos — vetou a obrigação no
comércio, em escolas, igrejas e templos. No discurso no Planalto, Bolsonaro também repetiu a pregação
que costuma fazer contra o isolamento social. Disse que provoca depressão,
fome, violência doméstica e elimina empregos. "A quarentena é para quem está infectado, não é para
todo mundo. Isso destrói empregos, mata de outra forma o cidadão, mata de fome,
de depressão, aumenta violência em casa, abuso contra criança." Ministro confirma
'estudo' À noite, em vídeo gravado pela assessoria do Ministério da
Saúde, o ministro Marcelo Queiroga disse ter recebido um pedido de Bolsonaro
para fazer um estudo sobre as máscaras. "Recebi do presidente Bolsonaro hoje uma solicitação
para fazer um estudo acerca do uso das máscaras", afirmou Queiroga, que
vem defendendo o uso da proteção. Ele reiterou essa afirmação em depoimento à
CPI da Covid. Segundo o ministro, Bolsonaro "acompanha o cenário
internacional" e "vê que em outros países onde a campanha de
vacinação já avançou, as pessoas já estão flexibilizando" o uso das
máscaras. "Então, vamos atender essa demanda do presidente
Bolsonaro, que está sempre preocupado com pesquisas em relação à Covid",
declarou. Especialistas
contestam Para especialistas ouvidos pelo G1 a proposta do presidente
é uma temeridade. Eles defendem que, mesmo após vacinadas, as pessoas precisam
usar máscara e evitar aglomerações. "A vacina tem boa eficácia em evitar que a sua doença
acabe se agravando e você precise até de hospitalização, mas ela não tem tão
boa eficácia em evitar que você se contamine", explicou a médica
infectologista Luana Araújo em vídeo gravado para o G1. "Então, enquanto a gente não tem uma boa parte de
população plenamente vacinada, é preciso sim usar máscara, evitar aglomerações
e preferir ambientes naturalmente ventilados", disse. O médico Drauzio Varella afirmou que mesmo os vacinados
podem transmitir o novo coronavírus para outras pessoas. "Você entra em contato com o vírus. O vírus fica nas
suas fossas nasais, não vai ficar doente, mas vai poder levar o vírus para
dentro de casa para as pessoas que você mais ama. Então, a vacina é uma grande
utilidade", declarou no último dia 12 de maio em podcast do programa
Fantástico. "Ela [a vacina] vai nos livrar do coronavírus, mas não
é porque estou vacinado ou porque você está vacinado que você fala: 'Agora
liberou geral''. Infelizmente, não. A gente tem que continuar agindo com
responsabilidade", disse. Munir Ayub, membro do Comitê de Imunização da Sociedade
Brasileira de Infectologia (SBI) e professor de Infectologia da Faculdade de
Medicina do ABC, afirmou que "não existe essa possibilidade" de se
prescindir do uso da máscara no atual estágio da pandemia. "Não tem nenhum sentido. É uma orientação apenas
política porque não tem nenhuma justificativa médica para isso. Mesmo a pessoa
que já teve ou que já foi vacinada não está livre de se reinfectar. Enquanto
estiver circulando o vírus neste nível alto, não existe essa possibilidade.
Neste momento é temerário", disse . Para Renato Grinbaum, infectologista da Sociedade Brasileira
de Infectologia, o anúncio de Bolsonaro é "completamente fora do
aceitável". "Não existe nenhuma lógica para suspender uso de
máscaras. A vacina previne bem as formas graves, mas não é uma ferramenta tão
poderosa para evitar infecções leves e transmissão. No momento em que se
discute aumento de casos em algumas regiões e a possibilidade de terceira onda,
este tipo de proposta é completamente fora do aceitável." Segundo Mellanie Fontes-Dutra, coordenadora da Rede Análise
Covid-19, "não há possibilidade de isso ser cogitado neste momento". "Nós não somos os EUA que estão vacinando em larga
escala e com um cenário bem diferente do nosso. Nós não somos Israel ou outros
países europeus que já estão em outro cenário da pandemia", afirmou. "Temos uma lei federal sancionada para o uso de
máscaras", disse, em referência à lei nº 14.019. O vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia,
Alberto Chebabo, afirma que não é possível comparar a situação do Brasil com a
dos Estados Unidos. “Não há a menor justificativa para isso na situação atual do
Brasil. Na comparação com os Estados Unidos, são situações epidemiológicas
completamente distintas. Aqui temos baixa cobertura vacinal, alta taxa de
infecção e circulação viral. Além disso, estamos no inverno, quando as
infecções respiratórias aumentam. Exatamente o contrário dos EUA”, disse o
infectologista. Estados Unidos Em 27 de abril, quando a agência reguladora de saúde dos
Estados Unidos decidiu dispensar o uso de máscaras em algumas circunstâncias
para pessoas plenamente vacinadas, mais da metade da população adulta do país
(cerca de 140 milhões de pessoas) já tinha sido vacinada com pelo menos uma
dose. Naquela data, o painel Our World in Data apontava que os EUA
tinham 43% da população total vacinada (conta feita sobre o total de
habitantes) com uma dose e 29% totalmente vacinadas (duas doses ou vacina de
dose única). No Brasil, até esta quarta-feira (9), a primeira dose tinha
sido aplicada em 51,8 milhões de pessoas, o que equivale a um quarto da
população (24,8%). Receberam a segunda dose 23,4 milhões de pessoas (11,06% da
população). A decisão dos EUA dizia respeito exclusivamente a pessoas
vacinadas e não a pessoas que já tiveram Covid-19. As máscaras continuaram
obrigatórias, por exemplo, em hospitais e no transporte público. A medida foi apontada como uma estratégia para incentivar a
vacinação. E foi tomada também quando o país constatava uma queda de 16% nos
novos casos na semana anterior, dado que foi apontado como a maior queda
semanal desde fevereiro.
Quando anunciou a decisão, a diretora do Centro de Controle
de Doenças dos Estados Unidos, Rochelle Walensky, fez um alerta: quem não se
vacinou continua sob risco de sintomas graves e de morrer, além de espalhar
Covid para outras pessoas. G1, com Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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