12/06/2021
Cientista mostra estudos no mundo inteiro comprovando ineficácia da cloroquina contra a Covid-19
BRASÍLIA, DF - A cientista Natalia Pasternak,
microbiologista da Universidade de São Paulo (USP), mostrou nesta sexta-feira
(11) em projeções no telão uma série de estudos científicos reconhecidos, de
diversas partes do mundo, mostrando que a cloroquina e outros medicamentos do
chamado "tratamento precoce" não funcionam contra a covid-19. — A cloroquina, infelizmente, nunca teve plausibilidade
biológica para funcionar. O caminho pelo qual ela bloqueia a entrada do vírus
na célula só funciona in vitro, em tubo de ensaio, porque nas células do trato
respiratório, o caminho é outro. Então ela já nunca poderia ter funcionado. Ela
nunca funcionou para viroses. A cloroquina já foi testada e falhou pra várias
doenças provocadas por vírus, como zika, dengue, chikungunya, o próprio Sars,
Aids, ebola... Nunca funcionou — asseverou a cientista. Pasternak acrescentou no telão outros estudos, detalhando
como se deram as pesquisas sobre a cloroquina, devido à pressão política de
alguns países em torno dela. Estas pesquisas demonstraram a impossibilidade de
o medicamento ter eficácia contra a covid-19. — A cloroquina já foi testada em tudo! Foi testada em
animais, em humanos. Foi testada de todas as formas e não funcionou. Inclusive
de 'tratamento precoce', que são os estudos de PEP e PrEP. PEP é a exposição
profilática pós-exposição, ou seja, a pessoa foi exposta ao vírus e já começa o
tratamento — não dá pra ser mais precoce do que isso. Não funcionou! Aí a gente
teve os PrEP, que é profilático. 'Vamos dar para profissionais de saúde', porque
eles são muito expostos: também não funcionou! Estamos há pelo menos 6 meses
atrasados em relação ao resto do mundo, que já descartou a cloroquina —
lamentou. Efeitos colaterais A pesquisadora ainda abordou que o chamado
"kit-covid", além de não funcionar contra a covid-19, pode ter
consequências mais graves para quem o consome. — O 'kit covid' não
têm nenhuma base científica, pelo contrário. No caso da hidroxicloroquina, ela
junto com a azitromicina não tem um teste de segurança, e são dois medicamentos
que podem ter como efeito colateral o aumento das complicações cardíacas. A
hidroxicloroquina também nunca foi testada em conjunto com azitromicina,
ivermectina, nitazoxanida e outros que aparecem no 'kit covid'. Estes
medicamentos nunca foram testados em conjunto. E podem ter, em conjunto,
interações medicamentosas que podem ser nocivas para os rins, para o fígado e
podem levar pessoas à fila do transplante, como tem ocorrido com usuários deste
kit — denuncia. Estudo do Amazonas Natalia Pasternak defendeu o estudo de abril de 2020 da
Universidade Federal do Amazonas (UFAM) com a Fiocruz e a USP, um dos primeiros
no mundo a evidenciar a ineficácia da cloroquina contra a covid-19. O estudo
tem sido atacado por defensores do "tratamento precoce", como senador
Luis Carlos Heinze. — Foi uma pesquisa de excelência, premiada
internacionalmente como um dos melhores trabalhos publicados em 2020. Uma
pesquisa extremamente bem conduzida, um estudo de segurança de dose. Que testou
duas doses diferentes para pacientes hospitalizados, e concluiu que a dose alta
era perigosa, não deveria ser usada. E que a dose baixa não alterava a carga
viral, não trazia nenhum benefício. O professor Marcus Lacerda [condutor da
pesquisa] foi quem mostrou que aumentar a dose não era seguro, e que a dose
baixa não servia — afirmou Natalia Pasternak. O relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL),
qualificou a viagem de uma comissão do governo brasileiro para Israel em março,
visando tratar sobre um spray nasal, de "um evidente caso de desperdício
de recursos públicos". Pasternak também explicitou que ficou surpresa com
as tratativas. — O spray nasal, quando a comitiva brasileira foi visitar,
estava numa fase tão inicial de pesquisas que surpreendeu inclusive os
pesquisadores israelenses. Ficaram surpresos que o Brasil tivesse interesse num
medicamento que ainda estava na Fase 1, no comecinho dos estudos clínicos. É um
remédio que está numa fase muito inicial, e que não tinha nenhum motivo para
atrair tanto interesse de qualquer governo — expôs. Número de mortes A senadora Katia Abreu (PP-TO) quis saber quantas mortes
poderiam ter sido evitadas caso o governo brasileiro tivesse feito o
"dever de casa" no controle do vírus. Pasternak citou um estudo do
epidemiologista Pedro Hallal, da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL),
publicado na revista científica medicinal inglesa The Lancet, dando conta que
ao menos três quartos das mortes no Brasil teriam sido evitadas. — São os dados do pesquisador e professor Pedro Hallal,
publicados na The Lancet, de que três de cada quatro mortes teriam sido
evitadas se o Brasil estivesse na média mundial de controle da pandemia. Ou
seja, quando atingirmos 500 mil mortes, isso quer dizer que 375 mil mortes
poderiam ter sido evitadas com um melhor controle da pandemia. Renan questionou se o governo deveria ter feito campanhas de
esclarecimento e de prevenção desde o início da pandemia para proteger a
população. Pasternak, que coordena o Instituto Questão de Ciência (IQC),
voltado à divulgação científica, qualificou de "desastrosa" a
ausência de política de comunicação por parte do governo . — Há exemplos de países, como Alemanha e Nova Zelândia, onde
esta comunicação foi feita diariamente pelos líderes. Falando com a população
de forma clara e transparente. Estes países se saíram muito bem ao chamar a
população como colaboradora. Já aqui o presidente da República se comporta de
forma contrária à ciência, e isso confunde a população. Pessoas o seguem e
acreditam nele. E quando ele aparece sem máscaras, desdenhando da pandemia,
fazendo pouco das pessoas que morreram e mostrando total falta de empatia, ele
confunde as pessoas, leva a uma ilusão de que está tudo bem — declarou. Investigações Para o senador Humberto Costa (PT-PE), a CPI está no rumo
certo ao aprofundar as investigações em torno da cloroquina. — Tem muita gente ganhando dinheiro com isso. Só a venda em
farmácias dos medicamentos do kit covid, entre março do ano passado e março
deste ano, foi de 52 milhões de comprimidos. Só da cloroquina foram mais de 32
milhões de comprimidos; a azitromicina cresceu 50% nas farmácias, com o
agravante de que é um antibiótico. Tem gente que ganhou muito dinheiro com a
ivermectina, por exemplo, e que financiou grupos de profissionais para defender
a ivermectina, para prescrever ivermectina. Isso é grave, é muito grave! —
disse Humberto Costa, que também é médico. O senador ainda mostrou preocupações com a vinda de uma 3ª
onda ao país, e que projeções internacionais já apontam que o Brasil pode
chegar a 750 mil mortos por covid-19 em agosto. Defesa do governo Alguns senadores buscaram se contrapor às falas da cientista.
Para Luis Carlos Heinze, a ivermectina "já tem comprovação
científica" no combate à covid-19. — Há cinco metanálises favoráveis, sendo duas já publicadas,
uma em maio pelo dr. Pierre Kory, e a outra agora em 6 de junho pelo dr.
Timotheus, tendo um preprint da dra. Tess Lawrie, uma das maiores especialistas
do mundo em medicina baseada em evidências, e do dr. Andrew Hill. Há ainda uma
pesquisa recente do dr. Smruti Karale, da famosa clínica Mayo dos Estados
Unidos — disse. Na resposta, voltou a negar a eficácia dos medicamentos
promovidos como "tratamento precoce" à covid-19. Pasternak afirmou
que boas metanálises devem incluir "os melhores estudos feitos sobre
aquele assunto". — Se a gente fizer uma metanálise só com estudos fracos, a
gente vai ter uma metanálise fraca, e daí vão poder dizer que algo funciona,
quando na verdade o conjunto das evidências que foi contemplado naquelas
metanálises é um conjunto de evidências fracas. Então precisamos ter
metanálises bem feitas. O grupo Cochrane é um grupo que faz isso muito bem,
reúne metanálises de qualidade, feitas classificando os melhores trabalhos que
foram feitos com a melhor metodologia, e analisando o poder estatístico de
todos os trabalhos. As metanálises, principalmente as do grupo Cochrane e alguns
outros grupos, que são metanálises de qualidade, é que devem ser levadas em
conta — declarou a especialista, lembrando que o consenso científico é
constituído a partir de inúmeras pesquisas, de diferentes níveis de qualidade. O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) foi outro que defendeu
as ações do governo contra a pandemia, especialmente o repasse de verbas.
— Nunca se investiu tanto em saúde. Só no ano passado foram
R$ 79 bilhões investidos na rotina do SUS, mais R$ 33 bilhões para a covid. O
saldo agora em março das prefeituras e dos estados, foi de R$ 9,5 bilhões nos
Estados e R$ 14,9 bilhões nos municípios. Sem falar em insumos e equipamentos
comprados, o que dá R$ 46,5 bilhões e R$ 11,2 bilhões — declarou. Agência Senado, com Foto Jefferson Rudy/Agência Senado
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