30/09/2021
Bolsonarista contrário à vacina integra entidade que intermediou venda de vacinas ao governo
BRASÍLIA, DF - Ao depor à CPI da Pandemia, nesta quinta-feira
(30), o empresário Otávio Oscar Fakhoury, vice-presidente do Instituto Força
Brasil (IFB), informou aos senadores que financiou a entidade, exerce o cargo
de direção simbólica, mas não participa, nem tem responsabilidade sobre os atos
de gestão. Conforme investigação da Comissão de Inquérito, o IFB tentou
intermediar a negociação de vacinas contra covid-19 entre a empresa Davati e o
Ministério da Saúde. O presidente do IFB, tenente-coronel Hélcio Bruno, já foi
ouvido pela CPI. Fakhoury informou que eles são amigos e que parou de ajudar o
Instituto, em junho ou julho deste ano, e que está avaliando a possibilidade de
mudança da diretoria ou mesmo de extinção ou de suspensão das atividades. A
informação chamou atenção do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP): — Ele suspendeu o financiamento após o depoimento do coronel
Hélcio a esta Comissão de Inquérito, o que mostra que a CPI tem papel
fundamental no esclarecimento de fatos que a sociedade não tinha conhecimento —
avaliou. Indagado pelo relator Renan Calheiros (MDB-AL) e por outros
senadores, o empresário disse não ter conhecimento como a Davati chegou ao
Força Brasil, nem que tipo de acordo ou acerto o instituto tentava fazer com o
governo para a compra de 400 milhões de imunizantes. A Davati Medical Supply é uma empresa que disse ser a
representante da AstraZeneca no Brasil. Só que a AstraZeneca alega não ter
representantes no país e que negocia somente com a Fiocruz. Comandada por
Herman Cardenas, a Davati é acusada também de tentar aplicar golpe no Canadá,
vendendo vacinas a uma associação de povos indígenas paralelamente ao governo
canadense. Sobre o caso, além de outras testemunhas e acusados, a CPI
ouviu dois supostos representantes comerciais da empresa, Cristiano Alberto
Carvalho e o cabo da Polícia Militar de Minas Gerais, Luiz Paulo Dominguetti
Pereira, que denunciou à imprensa ter recebido pedido de propina de US$ 1 para
cada dose negociada na venda da vacina AstraZeneca ao governo. O pedido teria
sido feito pelo ex-diretor de Logística do ministério, Roberto Ferreira Dias,
no dia 25 de fevereiro, em jantar no restaurante Vasto em Brasília. O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), destacou o
fato de o empresário Otávio Fakhoury ter feito de dezenas de manifestações
públicas questionando as vacinas e pertencer justamente ao instituto que
intermediou a compra de imunizantes com o Ministério da Saúde. Segundo Omar,
não há compatibilidade de pensamento entre os dois comandantes do IFB. — O senhor continua no instituto mesmo sabendo que seu
presidente [Hélcio Bruno] quis vender vacina que você é contra?. O presidente
desse instituto tentou vender vacina. O senhor não se vacinou e disse que sua
família não vai se vacinar — ironizou Omar. Os parlamentares quiseram saber também por que o Instituto
Força Brasil publicou durante tanto tempo tantas mensagens negacionistas sobre
a pandemia. Segundo o depoente, eram atos de gestão dos responsáveis dos quais
ele não participava. — Sou um filantropo. Quando eu faço doação eu não decido o
que é feito com o dinheiro. Os senhores, quando recebem doações de campanha
também, o doador não vai dizer o que o senhor faz com o dinheiro; o senhor
decide, a sua coordenação de campanha — rebateu o empresário. Bolsonaro O empresário disse ser apenas um apoiador mas não ter
relação pessoal com o presidente Jair Bolsonaro. Em 2018, informou ter feito
uma doação ao diretório regional do PSL em São Paulo. Sobre Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, Otávio
Fakhoury disse que o conheceu quando foi ser tesoureiro "por uns três ou
quatro meses" do PSL. Eles têm proximidade mas não são amigos pessoais. Segundo o relator da CPI, ambos tinham planos de comprar
rádios para implementar um projeto de direita. — Sempre tive um sonho, de participar do ramo de
comunicação. Pedi ao Eduardo que me indicasse donos de rádio para que eu
pudesse ir diretamente procurar e fazer uma negociação, o que não aconteceu.
Ele apenas fez uma indicação — explicou Fakhoury, que negou ter ido com Eduardo
à Secretaria de Comunicação tratar do assunto. Petrobras O relator Renan Calheiros (MDB-AL) questionou Fakhoury sobre
um reajuste de 400% em aluguel de imóvel à Petrobras, de propriedade do
depoente, mesmo depois de já haver um pedido de despejo. Segundo o senador,
houve aditivo, em maio de 2019, com reajuste que elevou o valor do aluguel de
R$ 30 mil para R$ 110 mil. Outro reajuste, na sequência, teria elevado o
montante a R$ 150 mil. Fakhoury não detalhou a negociação, que está, segundo ele,
judicializada, mas negou que os valores tenham sido direcionados a doação de
campanha eleitoral e chegou a dizer que a Petrobras lhe deve dinheiro. Diante
das indagações, o senador Marcos Rogério (DEM-RO) afirmou que a questão estava
“fora do escopo da CPI”. Fake news As mensagens do empresário consideradas ofensivas à honra de
senadores serão compartilhadas pela CPI da Pandemia com o inquérito das fake
news, em curso no Supremo Tribunal Federal (STF). Os parlamentares avaliam
ainda uma representação no Ministério Público Federal. As manifestações do empresário Otávio Oscar Fakhoury contra
vacinas e uso de máscaras e o argumento de que seus vídeos contra as medidas
sanitárias são um direito à liberdade de expressão causaram protestos de
senadores oposicionistas na reunião da CPI da Pandemia. O posicionamento de Fakhoury no depoimenyo levou a
constantes intervenções de alguns parlamentares, que se mostraram preocupados
com os impactos de notícias falsas no combate à pandemia de covid-19. — Isso não é liberdade de opinião. Quando a sua opinião
compromete a saúde de todos, isso não é liberdade de opinião. Isso é crime —
rebateu o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Os governistas, por sua vez, sustentaram a tese de que o
direito à manifestação precisa ser protegido, o que não exclui a
responsabilidade dos que cometem excessos. Para o senador Marcos Rogério, não
existe meia liberdade: — Dentro das nossas liberdades, em um dado momento, podemos
falar algo que depois podemos refletir, mudar de opinião ou mantê-la. É a
liberdade de expressão. Agora, não existe, repito, não existe meia liberdade.
Ou você é livre ou não é. Eventuais excessos já encontram no ordenamento
jurídico respaldo para serem punidos. Simplesmente isso, excesso pune-se na
forma da lei — opinou. A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) chegou a pedir à
presidência da CPI que, a cada fala considerada negacionista do depoente,
houvesse a intervenção de algum parlamentar do comando da Comissão Parlamentar
de Inquérito para esclarecimento do público. — Esta CPI tem um nível de audiência muito grande no Brasil
inteiro, as TVs estão transmitindo, e a população não pode receber uma
informação dele como se fosse verdade, porque não é — declarou. Mas, para o senador Jorginho Mello (PL-SC), cada um pode
falar o que quiser e tem que arcar com as consequências: — A CPI conclui mais um dia de trabalho questionando pessoas
que têm opinião. Posso até não concordar, mas há meios e instâncias próprias
para julgar. A liberdade é uma das coisas mais sagradas. Vacinas e máscaras Para Otávio Fakhoury, o uso de máscaras é desnecessário.
Segundo ele, o fato de ter gravado vídeos e publicado mensagens em redes
sociais sobre o assunto é também "uma simples manifestação de liberdade de
opinião". — Durante muito tempo, eu e algumas pessoas usamos máscara,
e pessoas pegaram a doença do mesmo jeito. Outras coisa: Dr. Fauci, a maior
sumidade americana, revelou que as máscaras não têm essa eficiência. São eficientes
para quem está com covid; para os outros, elas não têm eficiência de proteger
do vírus — argumentou. Indagado sobre as vacinas, Fakhoury disse que até hoje elas
estão em "caráter experimental",
não podem ser obrigatórias, e por isso disse não ter a pretensão de se
vacinar "por enquanto". O relator Renan Calheiros (MDB-AL) quis saber
ainda com base em quê ele classificou a Coronavac como “lixo de vacina”: — Critiquei com base em informações à imprensa naquele
momento. É uma conclusão pessoal baseada na minha liberdade de opinião —
afirmou. As declarações levaram a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) a enviar à CPI uma nota de esclarecimento dizendo todas as
vacinas usadas no Brasil passaram pelas fases 1, 2 e 3 de testes e são seguras
e eficazes. Ainda conforme a Anvisa, os imunizantes também foram autorizadas
pela Organização Mundial de Saúde e FDA, agência reguladora americana. Em relação ao distanciamento social, o empresário se disse
favorável ao "lockdown vertical", isolando-se pessoas do grupo de
risco, como idosos e portadores de comorbidades, de forma que a economia não
pare e que os empregos sejam preservados. Senadores mais uma vez pontuaram que
a tese defendida pelo depoente não tem base científica. Cronograma Logo na abertura da reunião desta quinta-feira, o presidente
da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), informou que o planejamento nesta reta
final de trabalho da CPI é que o relatório final seja apresentado em 19 de
outubro, para que a votação ocorra no dia 20. A semana que vem deve ser a última reservada a depoimentos.
A Comissão deve ouvir Carlos Alberto Sá, executivo e proprietário da VTCLog, na
terça-feira (5). Já na quarta-feira (6),
a previsão é ouvir um dos médicos que denunciaram práticas irregulares na
Prevent Senior. No dia seguinte, é a vez de um representante da Agência
Nacional de Saúde Suplementar. O relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL), confirmou o
calendário e aproveitou para anunciar que vai propor o indiciamento do
empresário Luciano Hang no relatório final da Comissão. Segundo o parlamentar,
Hang colaborou com a “política equivocada” de enfrentamento à pandemia
promovida pelo presidente Jair Bolsonaro. Denúncias
A CPI da Pandemia aprovou, também, a criação de um email
para receber denúncias de cidadãos a respeito da recomendação e execução de
tratamento precoce no contexto da pandemia de Covid-19. As denúncias devem ser
encaminhadas para cpipandemia.denuncias@senado.leg.br Agência Senado, com foto: Leopoldo Silva/Agência Senado
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