26/01/2022
Três partidos do “Centrão” comandam R$ 150 bilhões do Orçamento sancionado por Bolsonaro
BRASÍLIA, DF - Reconhecido por não ter amarras ideológicas e
transitar entre diferentes núcleos, o Centrão foi o maior beneficiado pelo
Orçamento da União sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). As siglas
PP, PL e Republicanos controlarão mais de R$ 149,6 bilhões do governo
Bolsonaro, o que deixa o chefe do Executivo entregue nas mãos do grupo. O
montante é maior que o orçamento estimado para 2022 dos ministérios da Defesa
(R$ 116,3 bilhões) e da Educação (R$ 137 bilhões). A peça orçamentária tem diversas peculiaridades, a começar
por destinar, pela primeira vez, tamanha quantidade de recursos apenas a três
partidos. O economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia (Corecon-
DF) Guidborgongne Nunes a define como “irracional, desintegrada e
desorganizada”. “Prevaleceram lógicas particulares diante do interesse público,
cortaram-se recursos do INSS e da educação para garantir emendas particulares,
e um orçamento federal neste contexto não está vinculado a políticas de
desenvolvimento”, explica. O economista ainda criticou a falta de rigor da
peça. “É uma irracionalidade orçar R$ 140 bilhões com base em emendas
parlamentares.” Tal destinação demonstra a liderança do bloco no governo, na
visão do cientista político Cristiano Noronha, da Arko Advice. Ele corrobora
que, independentemente da posição de Bolsonaro nas pesquisas, os partidos
tendem a apoiar o governo até o final da gestão. “O Centrão, qualquer que seja
o governo, é muito importante para a governabilidade, para construir maioria
sólida. O presidente precisa fazer esse tipo de acordo, abrindo caminho para
esses partidos no governo federal”, completou, emendando que qualquer que seja
o presidente, as siglas serão convidadas a compor o governo. O interesse do Centrão por cargos no Executivo é concreto.
Para o professor de ciências políticas do Ibmec Brasilia Rodolfo Tamanaha,
Bolsonaro, que estava reticente em contar com o grupo em um primeiro momento,
hoje fornece abertura, e até mesmo privilégios. “Por outro lado, o Centrão é
reconhecido como um conjunto de partidos que não é muito fiel. Exatamente
porque não existe uma adesão ideológica, o ponto de vista deles é muito mais
pragmático”, explicou. Por isso, Tamanaha acredita que, caso chegue o período
eleitoral e Bolsonaro corra o risco de não ser reeleito, é provável que haja
dispersão. O cientista político André Rosa também acredita na mudança
de lado. Rosa destacou que o apoio de partidos ao governo segue critérios como
cargos no primeiro e segundo escalões, maior controle do Orçamento e provento
de maiores vultos fiscais referentes às emendas parlamentares, que são
consideradas primordiais para a resposta aos eleitores, uma vez que viabilizam
políticas públicas. “O controle maior do Orçamento é diamante raro para os
congressistas e é neste ponto que o governo precisa estabelecer esses acordos;
caso contrário, a agenda sofre sérios riscos de não ser encaminhada, pois o
Centrão domina o espectro político”, avaliou. O analista político do portal Inteligência Política Melillo
Dinis analisa que tamanho apetite do Centrão por fatias do Orçamento se deve a
três movimentos: a captura dos recursos públicos por interesses privados
carimbados como articulação política; a submissão de Bolsonaro, que entregou a
maior parte do controle orçamentário nas mãos do ministro da Casa Civil, Ciro
Nogueira e do presidente da Câmara, Arthur Lira, e à falta de compromissos com
a transparência no uso do dinheiro público. Blindagem no
Congresso Ricardo Ismael, cientista político e professor da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), observa que a aproximação
inicial do presidente ao bloco foi estratégica e visou evitar o andamento de
processos de impeachment. “O bloco percebeu a fragilidade do presidente e tem
colocado as cartas na mesa exigindo cada vez mais recursos, fundamentais nesse
processo de reeleição de deputados federais, senadores. O Orçamento reflete
esse poder, que é consequência dessa procura por blindagem no Congresso. Nesse
aspecto, o presidente foi bem-sucedido na intenção de evitar um impeachment”.
Para ele, com a execução das emendas e afiliados do Centrão
ocupando cargos estratégicos, o afastamento de Bolsonaro, caso ele continue em
baixa nas pesquisas, deverá ocorrer no início de outubro. “O Centrão não tem
vocação de pular no abismo com Bolsonaro. O presidente pode ser ainda
competitivo no segundo turno, mas lá chegando tem poucas chances se mantiver as
condições atuais. O Centrão vai seguir sua tradição. Vai sugar o máximo
possível de recursos do governo e mais pra frente vai decidir qual é a
candidatura mais competitiva no primeiro turno”.a dos Deputados: base do
governo Bolsonaro ficou com as maiores fatias do Orçamento da União para este
ano. EM, com foto: Paulo Sérgio/Agência Câmara
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