06/04/2022

Bolsonaro pede que STF arquive inquérito que investiga se ele prevaricou na compra de vacina da Covaxin



BRASÍLIA, DF - O presidente Jair Bolsonaro recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta terça-feira (5), para pedir que a ministra Rosa Weber reconsidere a decisão de manter o inquérito que investiga suposta prevaricação de Bolsonaro no caso da negociação da vacina Covaxin. 

O recurso foi apresentado via Advocacia-Geral da União. No documento assinado pelo ministro Bruno Bianco, o governo pede que, se Rosa Weber não puder reconsiderar a própria decisão, submeta o tema à análise do plenário do Supremo. 

Prevaricar é retardar ou deixar de praticar um ato de que seria de responsabilidade do servidor público ou fazer isso de forma contrária à lei para "satisfazer interesse ou sentimento pessoal". O delito é listado entre os crimes praticados por servidores contra a administração pública. 

A investigação foi aberta a partir de pedido da CPI da Covid, depois que o deputado Luis Miranda (PR-DF) afirmou ter alertado presidente sobre suspeitas na compra da vacina indiana. 

A Procuradoria-Geral da República recomendou que o STF arquivasse o inquérito mas, como relatora do caso, Rosa Weber discordou e determinou a continuidade das investigações (veja no vídeo abaixo). A PGR também pediu, nesta segunda (4), que a ministra reconsidere a decisão. 

Recurso da AGU 

A Advocacia-Geral da União afirmou à Corte que, pelo sistema acusatório – em que há separação das funções de julgar e acusar –, cabe ao Judiciário acolher as conclusões do Ministério Público. 

"Se a PGR, ao final das investigações, entendeu pela inexistência de crime, em convergência com o entendimento da defesa, não há conflito e, nesta medida, não cabe ao magistrado substituir-se neste crivo, sob pena de grave cisão do devido processo legal substantivo". 

"O desacerto da decisão é flagrante não só à luz do sistema acusatório, mas das regras processuais que consubstanciam o regime jurídico adotado pelo Estado Brasileiro para o válido exercício da jurisdição, ou seja, do devido processo legal substancial, porquanto não há previsão constitucional para deflagração de processo a partir de determinação ou impulso do Poder Judiciário". 

A decisão de Rosa Weber 

Ao decidir pela manutenção do inquérito, Rosa Weber afirmou que, diante de ser comunicado de um possível crime, o presidente não tem "direito à letargia". 

Ela disse ainda que, ao ser informado de suposto delito, o presidente da República tem obrigação de acionar órgãos de controle. 

“Todas as razões anteriormente expostas evidenciam que, ao ser diretamente notificado sobre a prática de crimes funcionais (consumados ou em andamento) nas dependências da administração federal direta, ao Presidente da República não assiste a prerrogativa da inércia nem o direito à letargia, senão o poder-dever de acionar os mecanismos de controle interno legalmente previstos, a fim de buscar interromper a ação criminosa – ou, se já consumada, refrear a propagação de seus efeitos –, de um lado, e de 'tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados 'de outro', escreveu a ministra. 

CPI da Covid 

Em depoimento à CPI, no ano passado, o deputado Luis Miranda e o irmão dele, Luis Ricardo Miranda, funcionário do Ministério da Saúde, disseram ter informado a Bolsonaro as suspeitas envolvendo as negociações para compra da vacina produzida na Índia. 

Segundo eles, integrantes do alto escalão do ministério haviam feito pressão atípica para acelerar as negociações com uma empresa intermediária num valor acima do preço pago por outras vacinas. 

Primeiro, o presidente Jair Bolsonaro confirmou o encontro com os irmãos Miranda, mas disse não ter sido avisado das suspeitas. Depois, integrantes do governo passaram a dizer que Bolsonaro recebeu as denúncias e as repassou para o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. 

PGR não vê crime 

No parecer enviado em fevereiro ao Supremo, o procurador-geral, Augusto Aras, afirmou que o arquivamento do caso é "medida que se impõe", já que a conduta do presidente não pode ser enquadrada como prevaricação. 

Aras disse ainda que Bolsonaro não tinha o dever funcional de tomar nenhuma providência após ter sido comunicado de eventuais irregularidades, uma vez que essa atribuição não estava prevista nas competências no cargo. 

"Levando-se em consideração que o comportamento atribuído ao presidente não está inserido no âmbito das suas atribuições, as quais estão expressamente consagradas no texto constitucional, não há que se falar em ato de ofício violado, razão pela qual revela-se ausente o elemento normativo do tipo", escreveu. 

O procurador-geral também argumentou que, ainda que Bolsonaro tivesse o dever funcional de comunicar as suspeitas aos órgãos de fiscalização, o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) analisaram os contratos relativos à aquisição da Covaxin. 

Relatório da PF 

O relatório da PF sobre as investigações do inquérito foi enviado ao Supremo em 31 de janeiro. A Polícia Federal informou ter concluído que o presidente da República não cometeu o crime de prevaricação. 

No documento, o delegado William Tito Schuman Marinho afirmou que o conteúdo do contrato da Covaxin não foi alvo da investigação, assim como eventuais irregularidades ou crimes envolvendo a negociação. 

Marinho disse ainda ter considerado que Bolsonaro pode ter faltado com dever cívico, mas não cometeu crime. 

"É legítimo, por certo, do ponto de vista da opinião pública, esperar que a principal autoridade pública da República manifeste, de algum modo, um agir. Mas, mesmo assim, na hipótese de omissão, tal conduta se aproximaria mais de uma ausência do cumprimento de um dever cívico, mas não de um desvio de um dever funcional", escreveu o delegado.

g1, com foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Notícias no seu email

Receba nossas notícias diretamente no seu email. Cadastre-se.

Newsletter