08/04/2022
Presidente do FNDE diz que pastores ajudavam a organizar encontros do MEC com prefeitos em busca de verbas
BRASÍLIA, DF - Em audiência na Comissão de Educação (CE) do
Senado nesta quinta-feira (7), o presidente do Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE), Marcelo Lopes da Ponte, negou qualquer
envolvimento de colaboradores do fundo em corrupção na liberação de recursos
para municípios. — O [então] ministro [da Educação] Milton Ribeiro tem a
minha mais elevada estima. Acredito na conduta dele. Acredito que terceiros
usaram o nome dele, e o meu, eventualmente, para se gabaritar ou fazer lobby
sem a nossa autorização — afirmou Ponte aos senadores. Convidados para a mesma audiência, os pastores evangélicos
Gilmar Santos e Arilton Moura, acusados de tráfico de influência, enviaram
ofícios informando que não compareceriam. Isso levou o presidente da CE,
senador Marcelo Castro (MDB-PI), a afirmar que uma comissão parlamentar de
inquérito (CPI) "está cada vez mais próxima de acontecer". "Um
remédio amargo, porém necessário", declarou o senador em suas redes
sociais. — O que nós queremos é esclarecer os fatos. O que nos
compete é que os recursos públicos realmente cumpram sua função na sociedade,
para nós termos uma educação de melhor qualidade. Pelo menos ele [o presidente
do FNDE] veio aqui e prestigiou nossa comissão — ressaltou Marcelo Castro,
referindo-se à ausência dos pastores. Durante a audiência, o senador Carlos Viana (PL-MG), da base
do governo, declarou-se contrário a uma CPI, embora favorável à investigação
das denúncias. — Não é momento para isso. O país está precisando retomar o
crescimento, como está acontecendo — argumentou. O presidente do FNDE foi convidado pela comissão devido a
denúncias de que os pastores Gilmar e Arilton pediram propina a prefeitos em
troca da liberação de recursos do fundo. O caso acarretou a demissão do
ministro Milton Ribeiro, no final de março. Em outros dois casos relacionados
ao FNDE, nesta semana o Tribunal de Contas da União (TCU) suspendeu um pregão
para a compra de ônibus escolares, por suspeitas de sobrepreço, e a imprensa denunciou
a destinação, com recursos do FNDE, de kits de robótica a escolas que, em
alguns casos, nem sequer dispõem de computadores. Vídeo Respondendo ao senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Marcelo
da Ponte afirmou no início da audiência que conheceu os pastores "em
agendas no Ministério da Educação", e que nessas reuniões os pastores
"faziam alguma fala, uma oração, nada mais além disso que eu tenha
percebido". Pressionado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), ele
acabou admitindo que os encontrou "algumas vezes no FNDE" também. Marcelo da Ponte chegou a negar ter conhecimento de que os
pastores organizassem eventos com prefeitos. Randolfe exibiu, porém, um vídeo
de um evento em Salinópolis (SP) em que o presidente do FNDE se dirige aos dois
pastores, sentados à mesa de honra do evento, e declara: "Pastor Gilmar,
mais uma vez juntos, muito obrigado pela presença; pastor Arilton, que sempre
organiza...". — Foi um modo de falar. Eles me diziam, por exemplo, quantos
prefeitos estariam [lá], para eu saber o número de técnicos que precisava levar
para o evento — justificou Marcelo da Ponte. O presidente do FNDE acrescentou ter prestado
esclarecimentos à Controladoria-Geral da União (CGU) em um processo sigiloso
que apurou as denúncias. Anunciou ainda a suspensão preventiva dos repasses do
fundo aos municípios citados nas denúncias de corrupção cujos prefeitos foram
convidados a depor na CE na última terça-feira (5). Ônibus Interrogado por Randolfe especificamente sobre três nomes —
Garigham Amarante Pinto, diretor de Ações Educacionais do FNDE; Darwin Lima,
consultor do fundo; e Nely Jardim, suposta assessora informal dos pastores —,
Marcelo da Ponte confirmou apenas conhecer os dois primeiros. Disse não saber
de nada que "desabone a conduta" do primeiro, e que não poderia
"avalizar" a do segundo, por estar subordinado a uma diretoria fora
de sua alçada. O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) referiu-se ao papel de
Garigham Amarante no pregão dos ônibus escolares. Depois que, diante das
suspeitas de sobrepreço, um despacho reduziu o valor do pregão de R$ 2 bilhões
para R$ 1,5 bilhão, Garigham assinou um novo termo de referência, reavaliando o
pregão em valor próximo dos R$ 2 bilhões originais. Alessandro ressaltou que
isso ocorreu em data próxima a uma reunião do presidente do FNDE com o senador
licenciado Ciro Nogueira (PP-PI), hoje ministro-chefe da Casa Civil, e de cujo
gabinete parlamentar Marcelo da Ponte foi chefe. — Lá em Sergipe, meu estado, tem um negócio que se chama
"dança de rato": o cara fica de um lado para o outro. Por que esse
valor voltou para R$ 2 bilhões? O senhor sabe informar? — questionou o senador. — Não. Sei informar que o despacho final da diretoria, e a
instrução ao pregoeiro, ficou em R$ 1,567 bilhão. O pregão está seguindo todos
os processos da CGU [Controladoria-Geral da União] e recomendações que foram
feitas — respondeu o convidado. Governo Senadores do partido do presidente Jair Bolsonaro, Marcos
Rogério (PL-RO) e Carlos Portinho (PL-RJ) argumentaram que o caso evidencia não
haver corrupção no governo federal; afinal, segundo eles, não se concretizou o
tráfico de influência. — Nenhum governo é imune à tentativa de fraude. Mas aqui os
órgãos de controle funcionam, sobretudo internamente, coisa que não acontecia
nos governos do PT. Espertalhões certamente existem em todos os níveis do
governo. No governo do presidente Bolsonaro, até este momento, corrupção zero —
disse Marcos Rogério. Portinho acusou a imprensa de "desconhecimento sobre
gestão pública", referindo-se ao caso do pregão dos ônibus. Ele deu a
entender que um ônibus escolar é mais caro que um ônibus comum, por necessitar
de equipamentos específicos e, no caso daqueles destinados à zona rural, tração
dupla para circular em estradas precárias. Wellington Fagundes (PL-MT) e Lasier Martins (Podemos-RS)
lamentaram que a paralisação de obras, em razão de suspeitas de corrupção,
impeça a inauguração de novas escolas. Opinando sobre a questão, Marcelo da
Ponte defendeu que a lei permita a revisão do valor de obras "que estejam
saneadas", já que "uma obra de 2013 não tem o mesmo valor de hoje, e
o prefeito muitas vezes não consegue continuar uma obra com o valor que está
pactuado". Vários senadores, como Randolfe, Flávio Arns (Podemos-PR),
Styvenson Valentim (Podemos-RN) e Zenaide Maia (Pros-RN), fizeram referência ao
caso da compra dos kits de robótica. Marcelo da Ponte assegurou que "todas
as demandas atenderam critérios técnicos": — Nós não fornecemos esse kit robótica. Quem faz a licitação
é o município. Eu empenho, o município licita, faz a contratação, recebe, nos
presta as contas e fazemos o pagamento. Requerimentos Em reunião deliberativa que antecedeu a audiência, a CE aprovou
requerimento do senador Confúcio Moura (MDB-RO) para realização de audiência
pública sobre casos de violência em escolas ocorridos após a recente retomada
das aulas presenciais.
Também foi aprovado requerimento de Alessandro Vieira
solicitando ao Tribunal de Contas da União (TCU) informações sobre a aplicação
de recursos da União para serviços de conectividade em escolas. Agência Senado, com foto: Pedro França
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