22/01/2023
Lula reativa Conselho de Segurança Alimentar, extinto em 2019, no 1º dia do governo Bolsonaro
BRASÍLIA, DF - A volta do Conselho Nacional de Segurança
Alimentar e Nutricional (Consea) está entre os primeiros atos do novo governo
de Lula (PT). O órgão, composto por membros do governo e da sociedade civil,
deverá assessorar a presidência no combate à fome, tema que Lula afirma ser sua
“prioridade número um”. A reativação do Consea consta na Medida Provisória (MP)
1154/23, publicada no Diário Oficial no dia 1º. De forma simbólica, o órgão,
que volta a existir no primeiro dia do novo governo Lula, havia sido extinto em
2019, no primeiro dia do governo Bolsonaro (PL). Sob o comando de Bolsonaro, o Brasil atingiu a marca de 33,1
milhões de pessoas passando fome. “Há muito tempo não víamos tamanho abandono e desalento nas
ruas”, afirmou Lula no discurso de posse na Praça dos Três Poderes, para um
público de centenas de milhares de pessoas. “Trabalhadores e trabalhadoras
desempregados, exibindo nos semáforos cartazes de papelão com a frase que
envergonha a todos ‘por favor, me ajuda’”, disse, com a voz embargada. “Fila na porta dos açougues, em busca de ossos para aliviar
a fome”, prosseguiu o presidente petista, depois de se recompor. “E, ao mesmo
tempo, filas de espera para a compra de jatinhos particulares. Tamanho abismo
social é um obstáculo à construção de uma sociedade justa e democrática, e de
uma economia próspera e moderna”, apontou. A urgência do combate
à fome “A retomada do Consea é uma conquista da sociedade, que
nesses últimos quatro anos deixou de ser ouvida sob vários aspectos”, avalia
Paola Carvalho, diretora da Rede Brasileira de Renda Básica. “O Consea foi desativado num momento em que se entendeu, por
parte do governo federal, que debater a segurança alimentar e nutricional não
era algo fundamental para a sociedade brasileira. O que nos fez alcançar
patamares absurdos no Brasil em relação à fome”, constata Carvalho. Durante o governo Bolsonaro, o Brasil voltou para o Mapa da
Fome das Nações Unidas. Um país entra nesta categoria quando mais de 2,5% da
população enfrenta a falta crônica de alimentos. Segundo o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar,
pesquisa feita pela Rede Penssan, 15,5% da população brasileira está sem ter o
que comer. Além disso, as pessoas no país que não precisam se preocupar se vão
conseguir se alimentar no dia são, agora, minoria. Apenas quatro em cada 10
famílias têm acesso pleno à alimentação. É esse o cenário no qual o Conselho volta à ativa. Para a
historiadora Denise de Sordi, pesquisadora da Fiocruz e da USP, a notícia “não
só está em linha com o programa de governo que foi eleito e que agora inicia
seu mandato, mas também com o entendimento que o combate à fome precisa ser uma
política de Estado”. O que é e como
funciona o Consea O Consea foi criado em 1993, no governo de Itamar Franco
(Cidadania), que por sua vez assumiu a presidência depois do impeachment de
Fernando Collor de Melo (PTB). Extinto logo dois anos depois por Fernando
Henrique Cardoso (PSDB), o órgão foi reaberto em 2003, no começo do primeiro
governo Lula, como parte do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional (Sisan). Por esse órgão consultivo passaram e foram elaboradas, ao
longo da história, políticas de incentivo à agricultura familiar e
disponibilização de alimento saudável em equipamentos públicos. Entre elas, o
Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação
Escolar (PNAE), ambos desidratados nos últimos quatro anos. No PAA, o governo federal compra alimentos produzidos pela
agricultura familiar e os destina para que sejam ofertados, gratuitamente, em
equipamentos da rede pública como, por exemplo, Centros de Referência de
Assistência Social e restaurantes populares. No PNAE, o governo federal repassa
para estados, municípios e escolas federais, valores destinados a compra de
produtos da agricultura familiar para alimentação escolar. “O Consea não se dedica só às questões de insegurança
alimentar grave, como a temática da fome. Mas também faz discussões
fundamentais no Brasil sobre abastecimento, sobre qualidade alimentar”, explica
Paola Carvalho. Pesquisadora de políticas sociais no Brasil, Denise de Sordi
lembra que junto do retorno do Consea, "temos também a volta do Ministério
do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar, que também sinaliza para
uma reestruturação das políticas de produção de alimentos, incentivo à
agricultura familiar e combate à pobreza no campo. Não dá para esquecer que o
combate à pobreza passa pela articulação entre campo e cidade”.
"Agora, vamos aguardar para ver como serão as regras de
funcionamento desse novo Consea e como vai se dar a intersetorialidade das
políticas de combate à fome e à pobreza", destaca a historiadora. Gabriela Moncau/Brasil de Fato, com foto: Leopoldo Silva/Agência Senado
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