03/04/2023
Técnica de enfermagem é demitida por chamar bebê recém-nascido de “macaquinho”
BELO HORIZONTE, MG - Os julgadores da Nona Turma do TRT-MG,
por unanimidade, mantiveram a dispensa por justa causa de técnica de enfermagem
que tratou com rispidez paciente que havia dado à luz filhos gêmeos e fez
comentário ofensivo em relação a um dos bebês, de cunho racista, comparando-o a
um “macaquinho”. Nesse contexto, foi dado provimento ao recurso da empregadora,
uma instituição de saúde, para modificar sentença oriunda do juízo da 38ª Vara
do Trabalho de Belo Horizonte, que havia anulado a justa causa. De acordo com o desembargador André Schmidt de Brito, que
atuou como relator e cujo voto foi acolhido pelos julgadores, o comportamento
da técnica de enfermagem denota a ausência de postura profissional condizente
com o cargo ocupado e respalda a dispensa por justa causa fundada na alínea
"j" do artigo 482 da CLT. “A meu ver, a conduta da obreira é grave o suficiente para
respaldar a justa causa, não se cogitando, no caso, de necessidade de gradação
de pena, eis que a quebra de fidúcia restou evidente pelo descumprimento da
mais elementar obrigação da trabalhadora, que tem, como função primordial, o
cuidado humano”, destacou o relator na decisão. O julgador ainda verificou ter
sido atendido o princípio da imediatidade, considerando que a denúncia da
paciente foi levada à ouvidoria no dia seguinte ao ocorrido e, quatro dias
depois, após a apuração dos fatos, a técnica de enfermagem foi dispensada por
justa causa. Diante da manutenção da justa causa, foram consideradas
indevidas as verbas decorrentes da rescisão imotivada, com a exclusão da
condenação imposta na sentença. A instituição de saúde foi absolvida de pagar à
profissional o aviso-prévio indenizado, férias+ 1/3; 13º salário, multa de 40%
sobre o FGTS e multa do artigo 477 da CLT. Entenda o caso Segundo afirmou testemunha indicada pela empregadora, a
técnica de enfermagem estava trabalhando em plantão noturno, quando se
aproximou da paciente, que havia dado à luz filhos gêmeos e um dos bebês estava
internado na UTI. A profissional fez o seguinte comentário: “nossa, seu menino
parece um macaquinho”. Ainda de acordo com a empregadora, todos no setor,
inclusive os demais pacientes, ficaram desconcertados com a fala da
profissional, afirmando que a mãe ficou extremamente constrangida, sem
conseguir esboçar reação no momento da agressão. A empregadora alegou que, após
o ocorrido, o clima no setor ficou bastante comprometido, uma vez que a mãe das
crianças e os demais pacientes ficaram indignados e questionaram o que iria ser
feito diante da conduta absurda da técnica de enfermagem. Sustentou a
empregadora que, após o episódio, a ex-empregada passou a tratar a paciente de
forma bastante ríspida, o que agravou o estado emocional dela, que teve crise
de choro dentro da unidade em que estava internada. Conduta profissional
inadequada Na avaliação do relator, a prova oral produzida no processo
provou a conduta inadequada da profissional, de forma a inviabilizar a fidúcia
necessária à continuação do vínculo de emprego e autorizar dispensa por justa
causa. Concluiu-se que, dessa forma, a empregadora se desvencilhou do ônus da
prova, nos termos do artigo 818, II, da CLT, comprovando a prática de ato de
improbidade cometido pela trabalhadora, na forma do artigo 482, "j",
da CLT, suficiente para a ruptura contratual. Os fatos narrados foram, em parte, admitidos pela própria
profissional. Em depoimento, ela confessou ter se referido ao filho da paciente
como "macaquinho". Contudo, contextualizou a expressão na seguinte
frase: "o seu filho/bebê é cabeludinho, igual à minha filha, que parecia
um macaquinho". Segundo afirmou a trabalhadora, ao iniciar o plantão, a
mãe já estava chorosa e agitada, porque queria um acompanhante, o que não era
permitido pela maternidade. A profissional reconheceu que a paciente se encontrava em
uma situação delicada, tendo em vista que havia dado à luz gêmeos e que os dois
bebês estavam internados na UTI pediátrica e que essa situação deixa a mãe
apreensiva e vulnerável, o que, no seu entender, levou a uma reação exagerada e
desproporcional em relação ao ocorrido. Contou que foi chamada pela direção da
maternidade três dias após o ocorrido, quando foi questionada sobre a
utilização da palavra "macaco" em relação a um bebê internado na UTI.
Acrescentou que confirmou o fato, contudo, com a explicação de que a declaração
não teve cunho discriminatório ou ofensivo. Para o relator, as declarações da própria profissional não
deixaram dúvida sobre a existência do comentário com a utilização de expressão
pejorativa. Com relação à forma como a mãe dos gêmeos foi tratada pela
técnica, a própria paciente, ouvida como testemunha da empregadora, disse que
foi atendida pela ex-empregada após o nascimento de seus filhos, e que, em uma
determinada noite, foi tratada de forma ríspida e inadequada, não tendo
recebido qualquer auxílio por parte da técnica de enfermagem, embora ela
estivesse responsável pelos dois bebês, que, segundo alegou, choravam muito. A paciente confirmou que a profissional lhe disse que um dos
bebês parecia um "macaquinho", de tão "cabeludinho",
afirmando que o fato a fez chorar e a deixou muito chateada. Disse que, após o
ocorrido, fez uma reclamação junto à ouvidoria da maternidade. Testemunha apresentada pela instituição de saúde, que
ocupava o cargo de enfermeira e assumiu o plantão após o término da jornada da
técnica de enfermagem, relatou que foi comunicada por outra enfermeira, pela
secretária e pela paciente sobre os fatos ocorridos. Contou que a paciente lhe
disse que não havia sido bem tratada pela técnica de enfermagem, que se mostrou
indisponível para ajudar com os bebês e que comparou um deles a um
"macaquinho". Declarou que levou o fato ao conhecimento da coordenadoria
e que a mãe estava muito chorosa e abalada emocionalmente. Afirmou que a
paciente do leito ao lado também lhe relatou os mesmos fatos informados pela
mãe. Para o relator, “a situação da puérpera é ainda mais
delicada quando o bebê a que deu a luz demanda, por alguma razão, internação em
UTI pediátrica, o que deixa a mãe, já fragilizada pelo estado puerperal, ainda
mais apreensiva”. Na avaliação do desembargador, a conduta profissional
esperada da técnica de enfermagem era de acolhimento e cuidado com a mãe e com
os filhos recém-nascidos, sobretudo porque esta não contava com qualquer outra
ajuda, em razão de regras internas da própria maternidade, sendo as técnicas e
enfermeiras as únicas pessoas com quem poderia contar. “O infeliz comentário da
técnica de enfermagem em relação a um dos bebês, ainda que sem intenção
pejorativa ou racista, sem dúvida, é ofensivo, sobretudo sem qualquer
contextualização no momento em que realizado e, ainda, desprovido de um
necessário e esperado pedido de desculpas posterior”, registrou o relator. De acordo com o relator, as explicações da ex-empregada não
afastam a gravidade do ocorrido, mesmo porque, tratando-se de profissional
experiente e que lidava, diuturnamente, com mães em situação de
vulnerabilidade, “deveria ter ciência de que determinados comentários não são
adequados e devem ser evitados, sobretudo se passíveis de interpretações
ambíguas”.
Além disso, na visão do relator, acolhida pelos demais
julgadores, a profissional não procedeu de forma adequada no decorrer do plantão,
tendo tratado a paciente com rispidez e deixado de lhe oferecer o necessário
auxílio com os bebês recém-nascidos, situação que foi considerada ainda mais
grave por ter ocorrido no período noturno, quando a mãe já estava cansada dos
cuidados destinados aos filhos ao longo de todo o dia. O processo já foi
arquivado definitivamente. TRT-MG, com foto: Divulgação
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