25/04/2023
Chico Buarque diz que Bolsonaro “teve a rara fineza de não sujar o diploma do meu Prêmio Camões”
LISBOA, PORTUGAL - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e
o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, entregaram o Prêmio Camões,
o principal da literatura em língua portuguesa, ao músico, dramaturgo e
escritor brasileiro Chico Buarque. A cerimônia ocorreu nesta segunda-feira
(24), no Palácio Queluz, em Lisboa. “Por mais que eu leia e fale de literatura, por mais que eu
publique romances e contos, por mais que eu receba prêmios literários, faço o
gosto de ser reconhecido no Brasil como compositor popular e, em Portugal, como
gajo [moço] que um dia pediu que lhe mandassem um cravo e o cheirinho de
alecrim”, disse Chico Buarque, em referência à canção de sua autoria, Tanto
Mar. Durante discurso, Lula destacou que Chico Buarque conseguiu,
em suas obras, transformar o cotidiano das pessoas em poesias extraordinárias.
“Chico conseguiu sintetizar as paixões e os desejos de tantas Joanas e Joões,
de tantas Teresas e Josés Costas, de tantas Genis e Pedros pedreiros, de tantos
guris e mambembes de nossa gente”, disse. “Mas a vasta contribuição da obra de Chico Buarque vai além
de seus inegáveis aportes à riqueza literária da língua portuguesa e mostra que
arte e cultura estão entrelaçados com a política e com nossos ideais de
liberdade e democracia”, acrescentou o presidente. Em 2019, Chico Buarque foi o vencedor da 31ª edição do
Prêmio Luiz Vaz de Camões de Literatura, mas o ato de entrega não foi assinado
pelo então presidente Jair Bolsonaro. “É uma satisfação corrigir um dos maiores
absurdos cometidos contra a cultura brasileira nos últimos tempos”, disse Lula. “O ataque à cultura, em todas as suas formas, foi uma dimensão
importante do projeto que a extrema direita tentou implementar no Brasil. Não
podemos esquecer que o obscurantismo e a negação das artes também foram uma
marca do totalitarismo e das ditaduras que censuraram o próprio Chico no Brasil
e em Portugal”, completou o presidente. Em seu discurso, Chico lembrou os tantos autores e artistas
brasileiros “humilhados e ofendidos nesses últimos anos de estupidez e
obscurantismo”. “Reconforta-me lembrar que o ex-presidente teve a rara
fineza de não sujar o diploma do meu Prêmio Camões, deixando seu espaço em
branco para assinatura do nosso presidente Lula”, disse. “Lá se vão quatro anos que meu prêmio foi anunciado e eu já
me perguntava se me haviam esquecido”, brincou o escritor. “Quatro anos, com
uma pandemia no meio, davam às vezes a impressão de que um tempo bem mais longo
havia transcorrido. No que se refere ao meu país, quatro anos de governo,
funesto, duraram uma eternidade, porque foi um tempo em que o tempo parecia
andar para trás”, disse Chico Buarque. O Prêmio Camões foi instituído em 1988 por Brasil e Portugal
e reconhece, anualmente, autores cuja obra contribua para a projeção e o
enriquecimento do patrimônio literário e cultural da língua portuguesa. Ele é
realizado e financiado pela Biblioteca Nacional do Brasil e pela Secretaria de
Cultura de Portugal e conta com um grupo seleto de jurados brasileiros,
portugueses e africanos. O prêmio foi concedido a Chico Buarque levando em
consideração o conjunto da produção literária. Por ele, o artista receberá 100
mil euros. “Chico transformou em patrimônio literário comum os amores
de nossos povos, as alegrias de nossos carnavais, as belezas de nossos fados e
sambas, as lutas obstinadas de nossas cidadãs e cidadãos pela conquista da
liberdade e da democracia. Em seu cancioneiro, em suas peças de teatro e em
seus romances, o autor hoje homenageado nunca deixou de fazer da língua
portuguesa instrumento de transmissão de nossas culturas e de nossas lutas”,
disse o presidente Lula. Chico Buarque de Hollanda estreou como escritor de ficção em
1974, com a novela Fazenda Modelo. Em 1979, publica o livro infantil
Chapeuzinho Amarelo. O primeiro romance, Estorvo, foi lançado em 1991. Quatro
anos depois lança o segundo, Benjamin. Em 2003, publica Budapeste; em 2009,
Leite Derramado, e em 2014, Irmão Alemão. Ele também escreveu as peças de
teatro Roda Viva (1968); Calabar (1972); Gota D’Água (1974), e Ópera do
Malandro (1978). O autor foi o 13º brasileiro a receber o prêmio, que já foi
conferido, entre outros, a Raduan Nassar (2016), Ferreira Goulart (2010), Lygia
Fagundes Telles (2005), e Jorge Amado (1994). Depois de Chico Buarque, em 2022,
o ensaísta, poeta, professor, contista e romancista brasileiro Silviano
Santiago também foi agraciado com a premiação. Veja a lista completa de ganhadores do Prêmio Camões, CLIQUE AQUI. Visita O presidente Lula está em visita oficial a Portugal desde
sexta-feira (21). Nesta segunda-feira, mais cedo, ele participou de encontro
com empresários. Após a cerimônia do Prêmio Camões, o presidente participa de
recepção na residência oficial do Brasil em Lisboa.
Na terça-feira (25), Lula será homenageado em uma sessão
solene da Assembleia da República Portuguesa. Depois, a comitiva brasileira
embarca para Madri, capital da Espanha, onde também faz visita oficial, com
eventos até quarta-feira (26). Andreia Verdélio - Agência Brasil, com foto: Reprodução/Instagram/Chico Buarque
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