30/03/2021
Ex-líder do governo propõe projeto que dá a Bolsonaro mesmos poderes de situações de guerra
BRASÍLIA, DF - Ao mesmo tempo em que o governo de Jair
Bolsonaro anunciou a demissão da cúpula das Forças Armadas, nesta terça-feira,
30, aliados do presidente tentam avançar com um projeto para dar ao chefe do
Executivo o poder de instaurar uma condução típica de situações de guerra,
tendo a pandemia como justificativa. A medida, caso aprovada, abriria caminho
para Bolsonaro intervir nos Estados e derrubar restrições impostas por
governadores, como lockdowns. O pedido para o projeto ser votado em regime de urgência foi
apresentado em reunião de líderes para definir a pauta de votações da Câmara,
sob a defesa do deputado bolsonarista e líder do PSL na Casa, Major Vitor Hugo
(GO). O deputado, um dos parlamentares mais próximos do presidente, disse que a
iniciativa partiu dele. "Eu pensei em incluir mais a hipótese de pandemia
para a Mobilização Nacional", disse Vitor Hugo ao Estadão/Broadcast
Político. O projeto autoriza o uso do instituto da Mobilização Nacional,
mecanismo de gestão de crise previsto na Constituição para ser usado em casos
de o País entrar em guerra. O dispositivo dá poder ao presidente, entre outros,
para intervir nos processos produtivos, seja industrial ou agrícola, requisitar
a ocupação de bens e serviços e a convocação de civis e militares para atuarem
no enfrentamento da crise. Segundo advogados ouvidos pela reportagem, o projeto
ainda abre espaço para que o presidente da República assuma o controle das
Polícias Militares estaduais. "Na decretação da Mobilização Nacional, o Chefe do
Poder Executivo designará o órgão da administração pública responsável pela
coordenação dos esforços e especificará o espaço geográfico do território
nacional em que será realizada e as medidas necessárias à sua execução",
diz trecho do projeto apresentado pelo ex-líder de Bolsonaro na Câmara. Bolsonaro pode, assim, definir o território nacional como
"espaço geográfico" e passar por cima de governadores, que adotaram
uma série de medidas restritivas para evitar a propagação do vírus. A proposta
permite ainda a reorientação da produção, da comercialização, da distribuição e
do consumo de bens e da utilização de serviços. O presidente é crítico a essas
ações e chegou a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar
toques de recolher impostos na Bahia, no Distrito Federal e no Rio Grande do
Sul. O ministro Marco Aurélio Mello, porém, rejeitou o pedido. "A Constituição não fala que é para guerra. Fala que
pode ser usada para resolver um problema de grandes proporções", afirmou
Vitor Hugo. "Há a possibilidade de ser utilizado com a pandemia, mas tudo
com a aprovação do Congresso Nacional", completou. A medida difere do estado de sítio e do estado de Defesa,
mecanismos também previstos na Constituição para situações de crise.
"Enquanto o Estado de Defesa e o Estado de Sítio têm, entre suas medidas,
a restrição a direitos e garantias individuais e coletivos, como o direito de
reunião, o sigilo das comunicações e a liberdade de ir e vir, a Mobilização
Nacional tem por objetivo precípuo a reunião de esforços nacionais no campo da
logística, da produção, da comercialização e da distribuição de bens e
serviços, de modo a resguardar a sustentação material da população e do Estado
durante a situação de crise, até que seja superada", diz Vitor Hugo na
justificativa da proposta. Mesmo no caso de o projeto ser aprovado, Bolsonaro ainda
teria de pedir autorização do Legislativo para acionar a Mobilização Nacional.
Para isso, é preciso maioria simples do Congresso, ou seja, mais de 50% dos
parlamentares presentes no dia da votação.
Durante a reunião com os demais líderes da Câmara, não houve
apoio verbalizado ao projeto de Vitor Hugo. No entanto, um pedido de urgência
para colocar a medida como prioridade nas votações da Casa ganhou a assinatura
do líder do bloco que reúne os partidos do Centrão, deputado Hugo Motta
(Republicanos-PB), nesta terça-feira, 29. Estadão
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