29/04/2021
Requerimentos de aliados de Bolsonaro na CPI da Covid saíram do Palácio do Planalto
BRASÍLIA, DF - Dados "ocultos" nos arquivos
eletrônicos enviados à CPI da Covid nesta quarta-feira (28) indicam que pelo
menos 11 requerimentos protocolados por senadores aliados do governo foram, na
realidade, produzidos por funcionários do Palácio do Planalto. A assinatura da assessora especial da Secretaria de Assuntos
Parlamentares da Secretaria de Governo, Thaís Amaral Moura, aparece nos
metadados dos requerimentos para que a CPI convoque médicos e especialistas
alinhados ao governo Jair Bolsonaro – que defendem o uso de remédios cuja
ineficácia está cientificamente comprovada e criticam o isolamento social no
combate à Covid. Os metadados são informações inseridas automaticamente nos
arquivos digitais e que indicam a origem de um documento. Em fotos digitais,
por exemplo, os metadados informam o modelo da câmera e a data do registro. Em arquivos de texto, os metadados podem indicar o nome do
autor ou da pessoa que tinha feito login no sistema quando o documento foi
salvo. Essa assinatura não aparece escrita junto ao texto, mas fica armazenada
nas propriedades de cada arquivo. Ao todo, cinco dos 11 requerimentos protocolados por Ciro
Nogueira (PP-PI) e seis dos sete apresentados por Jorginho Mello (PL-SC) têm Thaís
Amaral Moura como autora. As informações foram reveladas pelo jornal "O
Globo" – em seguida, o G1 e a TV Globo também verificaram os dados. A TV Globo pediu posicionamento à Secretaria de Governo e
aos dois parlamentares. O senador Jorginho Mello informou que não comentará o
assunto; a TV Globo aguarda as outras respostas. Em oito desses 11 requerimentos, os dois senadores aliados
de Jair Bolsonaro se repetiram – apresentaram pedidos de convocação das mesmas
quatro pessoas: - Bruno Campello de Souza, doutor e mestre em psicologia
cognitiva pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e coautor de um estudo
que teria indicado relação entre medidas de lockdown e o aumento da mortalidade
por Covid; - Francisco Eduardo Cardoso Alves, especialista em Infectologia
pelo Instituto Emílio Ribas e defensor do uso da hidroxicloroquina – remédio
que não funciona contra a Covid; - Nise Yamaguchi, oncologista e imunologista que chegou a
ser afastada pelo hospital Albert Einstein ao comparar o medo da Covid-19 à
postura das vítimas do Holocausto nazista; - Paulo Mácio Porto de Melo, presidente da Comissão de
Residência Médica (COREME) do Hospital Militar de Área de São Paulo, contrário
ao lockdown e favorável ao suposto "tratamento precoce". Thaís Amaral Moura também assina, nos metadados, um
requerimento protocolado por Ciro Nogueira para que a CPI convoque o prefeito
de Chapecó, João Rodrigues. O político vem sendo elogiado nas últimas semanas por
Bolsonaro porque, supostamente, daria "liberdade aos médicos" para
usar remédios sem eficácia comprovada no tratamento da Covid. No início de
abril, reportagem do G1 mostrou que a mortalidade por Covid em Chapecó era
superior à média nacional. Entre os sete requerimentos apresentados por Jorginho Mello,
seis são assinados por Thaís Moura. Nesses documentos, o senador também pediu a
convocação de Roberto Porto de Melo e do procurador-geral de Justiça do Pará,
Gilberto Valente Martins – que apura supostas irregularidades em contratos do
governo do Pará para o enfrentamento do coronavírus. Os outros requerimentos apresentados pelo senador Ciro
Nogueira tem como autor um funcionário de seu gabinete. Já o único requerimento
do senador Jorginho Mello que não traz o nome da assessora do Palácio do
Planalto na autoria é assinado, nos metadados, pela Consultoria Legislativa do
Senado. Além da apresentação de requerimentos, o grupo governista na
CPI da Covid também atua para tentar retirar o senador Renan Calheiros (MDB-AL)
da relatoria dos trabalhos. Requerimentos à CPI Nas primeiras 24 horas de funcionamento, até a tarde desta
quarta, a CPI da Covid já acumulava 176 pedidos de informação a órgãos públicos
e convocação de ministros, ex-ministros e auxiliares do governo de Jair
Bolsonaro. A CPI foi instalada nesta terça e, durante a sessão, o
relator, Renan Calheiros (MDB-AL), apresentou um plano inicial de trabalho.
Esse plano prevê, por exemplo, a convocação do ministro da Saúde, Marcelo
Queiroga, e dos três ex-ministros da pasta no governo Bolsonaro. A votação do
plano está prevista para esta quinta. A maioria foi apresentada por parlamentares independentes e
de oposição, maioria na comissão. Os parlamentares aliados do Palácio do
Planalto, contudo, miram principalmente contratos referentes a estados e
municípios e medidas de tratamento precoce. Os requerimentos podem ser protocolados por todos os membros
da CPI e devem ser submetidos a votação no plenário da comissão. Outro aliado de Bolsonaro na CPI, o senador Marcos Rogério
(DEM-RO) apresentou pedidos de convocação de quatro governadores: João Doria
(PSDB-SP), Wilson Lima (PSC-AM), Rui Costa (PT-BA) e Helder Barbalho (MDB-PA).
A conduta de governadores na pandemia não é alvo da
comissão, e o regimento do Senado diz que não se admite CPI sobre matérias
pertinentes aos estados. Apesar disso, o aliado de Bolsonaro propôs que o
colegiado tome os depoimentos desses governadores. G1
|